sábado, 19 de julho de 2008

Rememoagem

Da meia-água de telhas de barro, observo a atafona distante. Vã e velha. Abandonada. Apenas um moinho em um mundo que já não enxerga gigantes. Obsoleto num mundo elétrico que dá luz e choque sem dar calor.

O tempo dos moinhos se foi, mas ainda me pesa às costas arqueadas. Como as sacas de farinha me pesavam quando garoto, ao entrar e sair por entre as pás ouvindo o gemer da mó. E como as sacas de farinha, os anos se empilham em minhas espáduas e deixam escorrer o branco sobre meus cabelos. Parcos velos que para ceder espaço ao tempo, precipitam-se como de uma ampulheta. E restam-me tão poucos grãos ainda por cair! Grãos alvos de farinha. Alvos do tempo, que os empurra implacável como o vento empurra as pás. Enquanto, dentro do moinho, à pedra resta apenas o vazio por moer e remoer.

Observo a moenda que se rende à idade. E me curvo dócil ao tempo que me arca o corpo. Enquanto o corpo, à última arca, arca. Até que os anos, empilhados todos uns sobre os outros, se desequilibrem e se precipitem junto com os últimos grãos de farinha. Resta-me apenas o tempo que range em migalhas sob a mó.

Um comentário:

Rodrigo Oliveira disse...

Mais um do Duelo de Escritores. Esse era para falar sobre "Idade". Se quiser ler os textos dos outros participantes clica no link ali do lado ou vai no www.duelodeescritores.com.